O grupo do latifundiário João Santos conta com cerca de 44 empresas e possui dívidas com cerca de 20 mil trabalhadores, além das dívidas tributárias por sonegação de impostos. É um desafio identificar em quantos segmentos a família Santos atua, inclusive por possuírem fundos internacionais em bancos suíços.
No processo que corre no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), é possível identificar os latifúndios canavieiros que são a origem da família, além de empresas como a Cimento Nassau, diversos CNPJs de agropecuárias e do ramo da celulose espalhadas por várias regiões do país, como a Agrimex, a Itaipava S/A, veículos de imprensa como a TV Tribuna, transmissora da Bandeirantes em Pernambuco, e a Companhia Agroindustrial de Goiana S/A (CAIG). Essa última empresa tem um histórico de conflitos agrários na Zona da Mata pernambucana.
O conglomerado divulgou que o faturamento alcançou o valor de R$ 1 bilhão em 2023 e, mesmo assim, o grupo segue descumprindo os acordos judiciais. O herdeiro do latifúndio, Fernando Santos, foi condenado a 13 anos e 4 meses de prisão por crime contra a ordem tributária, poucos meses após a divulgação do faturamento da empresa. Não há informações sobre o cumprimento da prisão.
Ele e o irmão Bernardino tornaram-se réus por lavagem de dinheiro, crime trabalhista e organização criminosa. Segundo a Polícia Federal, os herdeiros do grupo são líderes de um “refinado” esquema de lavagem de dinheiro que conta com outros 24 investigados ligados ao grupo empresarial. Na operação da Polícia Federal realizada na casa dos herdeiros, foram encontradas diversas joias, carros de luxo, várias lanchas, obras de arte, além da existência de uma mansão em uma ilha particular no litoral de Pernambuco.
O que fica demonstrado é que os latifundiários sonegam os impostos e exploram os trabalhadores para maximizar ainda mais o enriquecimento pessoal, enquanto os funcionários das empresas chegam a passar oito meses com salários atrasados, aguardam anos o recebimento do que lhes é devido e/ou tiveram seus direitos trabalhistas roubados. Trabalhadores das fábricas de cimento do grupo em Manaus denunciaram ao Amazônia Real que muitos dos trabalhadores morreram sem receber suas indenizações, alguns deles por doenças causadas pelo trabalho realizado nas fábricas de cimento do grupo.
A relação histórica entre o grupo latifundiário e a violência contra camponeses
A CAIG é o principal exemplo de violência contra camponeses organizados em Pernambuco. A empresa foi fundada em plena ditadura empresarial-militar após a repressão às Ligas Camponesas com o golpe militar preventivo de 1964, assim como grande parte das Usinas existentes na Zona da Mata de Pernambuco.
Com o declínio das Usinas Canavieiras na década de 90, terras que pertenciam ao conglomerado do GJS nos municípios de Condado e Gameleira (PE) estavam improdutivas ou possuíam dívidas milionárias com os trabalhadores, o que elevou a luta pela terra na região, na reivindicação dos direitos dos camponeses.
Diante da omissão histórica do INCRA na Zona da Mata pernambucana, os camponeses decidiram dar início a um processo de auto-assentamento, o que levou ao aumento da violência do latifúndio contra os trabalhadores e, consequentemente, ao aumento da consciência política sobre as condições de trabalho dos canavieiros da Zona da Mata.
Em 1998, os canavieiros organizados pelos sindicatos entraram em greve para reivindicar melhoria salarial. Cada camponês recebia R$ 2,50 para cada tonelada de cana cortada. Durante a greve, pistoleiros da CAIG e policiais militares uniram-se para realizar um massacre contra os trabalhadores. Luiz Carlos da Silva, trabalhador da Usina Santa Tereza, foi assassinado com um tiro na nuca, e outros 13 camponeses ficaram feridos.
Em 2017, a CAIG e o Estado de Pernambuco foram condenados pela morte do trabalhador. Somente em 2019 aconteceu a regularização fundiária dos auto-assentamentos de Condado e Gameleira, com a criação do Assentamento Luiza Ferreira.
Venda de usinas aumentará violência do latifúndio na região
A Recuperação Judicial do grupo foi aprovada nas últimas semanas do ano de 2024 e atualmente aguarda a homologação do plano para iniciar a venda de ativos da empresa. A maioria desses ativos está localizada em áreas rurais que historicamente são territórios de intenso conflito agrário.
Um desses ativos é a Usina Santa Tereza, que pertence à Companhia Agroindustrial de Goiana (CAIG) e que possui diversas outras áreas ocupadas por camponeses do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) há ao menos duas décadas, em uma região que fica entre a fronteira de Pernambuco e a Paraíba.
Anteriormente, em reportagem do AND, foram relatados os assassinatos de ao menos quatro camponeses nessa região, e que esses casos estão ligados ao processo de tomada de terras improdutivas ou com dívidas trabalhistas/tributárias de antigas usinas que declararam falência.
Além disso, já havia sido noticiada em matéria do AND que a maioria das terras dessa região já haviam sido destinadas à Reforma Agrária na década de 1970, e que foram continuamente griladas por latifundiários da região, que atualmente continuam agindo para expulsar camponeses por intermédio da violência e da conivência do velho Estado burguês-latifundiário, como no caso da Usina Maravilhas, localizada a menos de 15 quilômetros da Usina Santa Tereza e de dois acampamentos do MST.
No caso da reportagem especial sobre a Usina Maravilhas, foi identificada a união dos canavieiros com usinas fotovoltaicas para contratação de pistoleiros, além de fortes indícios da atuação de milícias compostas por policiais militares de Pernambuco e da Paraíba, que intimidam e violam diariamente o direito dos camponeses de viver e produzir na terra. Com o andamento da Recuperação Judicial do Grupo João Santos, fica evidente que esse processo servirá para acirrar ainda mais o conflito agrário na região e gerar mais instabilidade jurídica e social para os camponeses acampados.
O que é comum acontecer em casos como esse é a lavagem de terras, onde os latifundiários se negam a entregar essas terras com dívidas milionárias para a Reforma Agrária ou aos trabalhadores que foram explorados nos canaviais por diversas gerações. Os latifundiários fazem isso para que possam continuar com essas terras em suas mãos e garantir a permanência da concentração fundiária.
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