O Brasil real e o Brasil do mercado
Por Larissa Rodrigues
Repórter do blog
Na mesma semana em que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que os números da pobreza e da extrema pobreza caíram no Brasil para os menores índices desde 2012, outro levantamento também trouxe dados expressivos: a reprovação do Governo Lula (PT) entre agentes financeiros é de 90%, segundo a pesquisa Genial/Quaest.
Para 96% dos profissionais do mercado ouvidos, a política econômica do país está indo na direção errada. Somente 4% dos entrevistados disseram que o governo está no caminho certo, segundo a Quaest. A pesquisa com os agentes foi divulgada no último dia 4, mesma data em que o IBGE apresentou os números, indicando que, em 2023, o Brasil alcançou os menores níveis de pobreza e de extrema pobreza na série histórica, iniciada em 2012.
Significa que 8,7 milhões de pessoas saíram da pobreza no país, entre 2022 e 2023. O Banco Mundial considera que estão nessa fatia da população todos e todas que recebem menos de R$ 665 por mês. Outros 3,1 milhões de brasileiros e brasileiras saíram da extrema pobreza. Nesse grupo, estão os que ganham até R$ 209 por mês.
Leia maisA população pobre recuou de 67,7 milhões de pessoas para 59 milhões (31,6% para 27,4%). Já a população extremamente pobre era de 12,6 milhões de pessoas e foi reduzida para 9,5 milhões (5,9% para 4,4%). O IBGE atribui os resultados a dois fatores: os programas sociais do governo, como o Bolsa Família, e o recuo do desemprego.
No final de novembro, o Instituto de Geografia divulgou que a taxa de desemprego do Brasil atingiu 6,2% no trimestre encerrado em outubro deste ano (agosto, setembro e outubro). Trata-se do menor nível de desocupação também desde 2012. No mesmo trimestre de 2023, a taxa era de 7,6%. Segundo o IBGE, o Brasil registrou 103,6 milhões de pessoas empregadas até o final de outubro de 2024, número recorde.
Em um país como o Brasil, onde o principal problema (e que gera todos os outros) é a desigualdade social, pobreza e desemprego caindo deveriam ser fatores de influência na imagem do governo. Mas não são. Pelo menos não para os agentes financeiros ouvidos pela pesquisa Genial/Quaest, já que quase a totalidade dos entrevistados considera o governo ruim.
O MERCADO É UMA BOLHA – A Quaest entrevistou 105 gestores, economistas, analistas e tomadores de decisão do mercado financeiro em fundos de investimento, de 29 de novembro a 3 de dezembro deste ano, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Os números revelam uma profunda desconexão desse grupo com o Brasil real. Na verdade, é quase um desprezo mesmo. Insatisfeitos com o pacote de corte de gastos apresentado pelo governo, no qual consta a isenção de imposto de renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil, o mercado reagiu avaliando negativamente a gestão.
Problema teu, te vira – Para o mercado, não importa se milhões de pessoas saíram da miséria, o que na maioria das vezes significa ter o mínimo de dignidade para um ser humano, uma refeição ao dia. Não importa se finalmente milhões de pessoas conseguiram uma carteira assinada e entrarão em 2025 com mais esperança. Assim como não vale de nada tirar um pouco a corda do pescoço do contribuinte que faz ginástica com o salário todo mês, liberando ele do IR.
Tarcísio de Freitas – Esse mesmo mercado financeiro, totalmente desconectado com a população verdadeira do Brasil, é o que defende o nome do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para as eleições presidenciais em 2026. Segundo a pesquisa Quaest, num eventual cenário de segundo turno entre Lula e Tarcísio, 93% dos entrevistados dizem preferir o governador, contra 5% que declaram voto no petista.
Violência policial contra pobres – O governador mais querido pelo mercado financeiro, aquele mesmo mercado que desconhece a realidade da vida da imensa maioria da população brasileira, esteve nos holofotes a semana passada inteira com a sua polícia militar envolvida em casos de violência contra, vejam só, pessoas pobres. Entre os incidentes de maior repercussão, estão o episódio no qual os PMs de São Paulo jogaram um entregador de 25 anos de cima de uma ponte e o caso da idosa de 63 anos, moradora de uma periferia, que foi agredida na testa por policiais na frente de casa. As imagens da senhora sangrando pelo rosto e chorando ganharam a internet e são estarrecedoras.
Olhar além do próprio umbigo – O que falta para os agentes do mercado financeiro, que torcem o nariz para o Governo Lula, é descobrir que o Brasil não é a Faria Lima, a famosa avenida de São Paulo, entre os bairros de Pinheiros e Itaim Bibi, que concentra sedes de grandes empresas. Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP), 75% da população brasileira pertencem às classes C, D e E. Pelos dados do IBGE, o país ainda tem 68,5 milhões de pessoas pobres e extremamente pobres, embora os esforços do governo que a Faria Lima rejeita tenham diminuído um pouco essa realidade. É essa massa majoritária de menor renda que precisa ser prioridade do governo. É para essa fatia que a política econômica precisa trabalhar.
CURTAS
Fala do ministro – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comemorou a redução da pobreza e da extrema pobreza, no dia em que o IBGE divulgou os números. “O IBGE acaba de dizer que estamos no menor índice de miséria da série histórica, e conseguir fazer isso em menos de dois anos é uma coisa muito importante. Um país sem miséria e sem fome é a primeira providência que qualquer Estado deveria almejar”, declarou Haddad.
Choque de realidade – Depois de enfrentar um início de gestão com relacionamento difícil com a Alepe, a governadora Raquel Lyra (PSDB) viu que não havia condições de governar um Estado de forma autoritária e unilateral, como se fosse dona de Pernambuco. Isolada e acuada com a força do Poder Legislativo, recuou. Viu que não tinha a menor chance de se meter na eleição da nova mesa diretora da Casa.
Governistas à deriva – Na narrativa governista, o gesto foi vendido como respeito pela Assembleia. Mas a verdade é que Raquel foi estratégica e não se envolveu para não ter um presidente de personalidade forte como Álvaro Porto (PSDB), popular entre os colegas, chateado e trabalhando contra o governo nos seus dois últimos anos de gestão. O problema é que com essa atitude, Raquel acabou deixando a bancada governista da Casa à deriva. O próprio Gustavo Gouveia (SD), aliado de Raquel, ficou sem ajuda do Palácio e acabou perdendo a primeira-secretaria.
Perguntar não ofende – O grupo dos Gouveia vai permanecer ao lado da governadora Raquel Lyra em 2026?
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