A declaração oficial da 16ª cúpula do Brics, publicada nesta quarta-feira (23), reforça a necessidade de reforma dos organismos internacionais, especialmente do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), com objetivo de ampliar o poder e a voz dos países menos desenvolvidos.
Além disso, o documento projeta a construção de uma nova ordem mundial multipolar, ou seja, fundada em vários centros de poder. Com 43 páginas e 134 itens, a Declaração de Kazan, que recebe o nome da cidade russa onde ocorre a cúpula dos Brics, trata de praticamente todos os temas em destaque na agenda internacional, como o enfrentamento às mudanças climáticas, a gestão da inteligência artificial e as guerras em curso no planeta.
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A declaração conjunta enfatiza a necessidade de se promover um mundo multipolar. “A multipolaridade pode expandir oportunidades de países em desenvolvimento e de mercados emergentes para desbloquear seu potencial construtivo, garantindo benefícios para todos”, diz o documento.
Nova realidade
Os países do Brics pedem reformas na governança global que reflitam a nova realidade econômica e geopolítica internacional. “Nós apelamos à reforma das instituições de Bretton Woods, incluindo a expansão da representação de países em desenvolvimento e de estados emergentes em posições de liderança para refletir sua contribuição para a economia global”, afirma o grupo.
Na reunião realizada entre os países membros, nesta quarta-feira (23), com a participação por videoconferência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente chinês Xi Jinping reforçou a necessidade de ampliar a cooperação entre os países do Sul Global e a reforma das instituições internacionais.
“O ritmo da reforma da governação global tem estado em descompasso com as rápidas mudanças no equilíbrio do poder internacional”, afirmou Xi, acrescentando que a cúpula “estabelecerá diretrizes claras para a cooperação entre os Brics e abrirá um novo capítulo para a unidade e interação no Sul Global”.
O Sul Global é o termo usado para se referir aos países pobres ou emergentes que, em sua maioria, estão localizados no Hemisfério Sul do planeta.
Para o coordenador do Grupo de Estudos sobre o Brics da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Borba Casella, a Declaração de Kazan inova ao citar a expansão do bloco, que deve contar com novos membros associados. Além disso, acrescenta que a construção do mundo multipolar ainda precisa ser organizada.
“Ter um mundo multipolar pode fazer sentido quando a gente vê a parcialidade dos Estados Unidos e das potências ocidentais, em especial em relação à Israel. A questão é como pretendem ver organizados os países do BRICS Plus? A ideia pode ser boa, vai depender de como eles propõem que isso se organize”, comentou.
A Declaração de Kazan afirma a intenção de expandir a organização do Brics. “A expansão da parceria do Brics com países em desenvolvimento e mercados emergentes continuará a promover o espírito de solidariedade e de verdadeira cooperação internacional”, afirmam os países membros.
O documento ainda reforça a necessidade de mecanismos de financiamento e comércio em moedas locais, como força de fugir da dependência do dólar. “Incentivamos o uso de moedas nacionais quando realizar transações financeiras entre os países do BRICS e seus parceiros comerciais.”
Guerras
O texto aborda os principais conflitos em andamento hoje no mundo, desde a Ucrânia até o Líbano, passando pelo Sudão e Palestina. Sobre a guerra na Faixa de Gaza, o grupo expressa preocupação com a nova escalada do conflito no enclave, pede o cessar fogo imediato e a libertação imediata dos reféns tanto de Israel quanto de palestinos, além de condenar o deslocamento forçado de civis e os ataques contra instalações humanitárias e infraestrutura civil.
“Confirmamos nosso apoio à admissão do Estado da Palestina como membro pleno da ONU no contexto de um compromisso inabalável com o conceito de coexistência dos estados com base no direito internacional”, diz o documento.
A Declaração de Kazan também expressa preocupação com a situação no Líbano. “Condenamos as mortes de civis e os enormes danos causados infraestrutura civil como resultado dos ataques israelenses contra civis áreas do Líbano, apelamos ao fim imediato da guerra”, afirmam os países, chamando de terrorismo o ataque de Israel usando pagers no Líbano.
“Condenamos o planejado ataque terrorista para minar dispositivos de comunicação portáteis em Beirute em 17 de setembro de 2024, que matou e feriu dezenas de civis. Declaramos que tais ataques constituem grave violação do direito internacional”, afirmam.
Sobre a guerra na Ucrânia, iniciada com a invasão russa em fevereiro de 2022, a Declaração diz que todos os estados envolvidos devem agir de acordo com os princípios da Carta da ONU. “Temos o prazer de observar ofertas apropriadas de mediação e bons ofícios, concebido para garantir uma resolução pacífica do conflito através diálogo e diplomacia”, afirmam.
A declaração oficial da 16ª cúpula do Brics também faz duras críticas às sanções econômicas aplicadas unilateralmente por potências ocidentais contra países. Atualmente, Venezuela, Rússia, Irã, Cuba e China sofrem com sanções econômicas principalmente dos Estados Unidos (EUA).
Para o professor de direito internacional da USP, Paulo Borba Casella, a Declaração omite que parte dessas sanções é resultado da invasão que a Rússia fez na Ucrânia. “Eles fazem cara de paisagem dizendo que as sanções são abusivas e não deveriam ser adotadas, mas esquecem de dizer porque as sanções existem”, comentou.
Da Agência Brasil
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